No dia 13 de agosto de 2025, a Justiça do Maranhão condenou Maria José Coelho Aguiar pelo crime de injúria racial, após ofender a técnica de radiologia Poliana Cristina da Silva Almeida com a expressão racista “cabelo de fuá”, em dezembro de 2023, na Clínica Bem Família, no Maiobão (Paço do Lumiar/MA).
Audiência de instrução e julgamento com a atuação das advogadas Lígia Santos e Marcela Gonçalves (CCN) e oitiva da vítima Poliana. Presença da Comissão de Igualdade Racial e Direitos Humanos da OAB/MA e da Associação Nacional de Advogados Negros (ANAN) como amicus curiae.
A sentença, proferida pela 2ª Vara de Paço do Lumiar, enquadrou a agressora no art. 2º-A da Lei 7.716/89, reconhecendo a gravidade da conduta e estabelecendo pena de 2 anos de reclusão e multa, substituída por medidas alternativas (prestação de serviços à comunidade, limitação de fim de semana e regime aberto). A ré permanece em liberdade, mas terá seu nome incluído no rol dos culpados.
Durante o processo, Poliana relatou o impacto emocional da ofensa, destacando que o cabelo, enquanto símbolo de sua identidade negra, foi alvo de ataque discriminatório. O depoimento do segurança da clínica, que presenciou e repreendeu a agressora, foi decisivo para reforçar a materialidade do crime.
A Justiça reconheceu que, em casos de injúria racial, a palavra da vítima, quando corroborada por testemunha, tem especial relevância probatória, uma vez que tais ofensas costumam ocorrer em contextos de vulnerabilidade e invisibilidade social.
A audiência de instrução e julgamento(realizada em abril de 2025) contou com a presença da Comissão de Igualdade Racial e Direitos Humanos da OAB/MA, atuando como amicus curiae, e da Associação Nacional de Advogados Negros (ANAN), além da atuação das advogadas do Centro de Cultura Negra do Maranhão, Lígia Santos e Marcela Costa Tavares, habilitadas na defesa da vítima. Também foi ouvida a testemunha Welson, segurança da clínica, além do depoimento da própria Poliana, que emocionou todos os presentes: “No dia da audiência foi um dia que mexeu psicologicamente comigo, eu chorei, mas graças a Deus eu tive uma rede de apoio grande. Além do Centro de Cultura Negra do Maranhão, da advogada Lígia Santos e da doutora Marcela, eu também tive apoio de vários outros advogados da OAB, que lutam também contra esse tipo de crime. Para mim, isso é um crime, e graças a Deus eu fui bem amparada. Casos como esse não podem passar em vão, porque isso dói na alma, isso pesa.”
Segundo dados do Disque 100, o Maranhão registrou em 2024 um aumento de 300% no número de denúncias de crimes de racismo e injúria racial: de 19 casos em 2023 para 76 no ano seguinte. No Brasil, o crescimento foi de 103,82%, passando de 3.191 casos em 2023 para 6.504 em 2024. Esses números evidenciam que o racismo não é um problema isolado, mas estrutural — e reforçam a importância de decisões judiciais que tratam o tema com a devida gravidade.
A advogada Lígia Regina Santos Ferreira, assessora jurídica do Projeto Vida de Negro (PVN) do Centro de Cultura Negra do Maranhão, avaliou a decisão como um marco no enfrentamento ao racismo: “Essa decisão reafirma que ofensas baseadas em raça ou cor não serão toleradas e que o sistema de justiça está atento à gravidade dessas condutas. O principal desafio foi evitar que a ofensa fosse tratada como um simples desentendimento. Demonstramos, com base na lei e na jurisprudência, que a expressão usada tinha caráter discriminatório e visava atingir a dignidade da vítima. Essa vitória mostra que denunciar é um ato de coragem e que a Justiça pode, sim, ser instrumento de reparação e transformação social.”
O Maranhão registrou um aumento de 300% no número de denúncias de crimes de racismo e injúria racial em 2024, segundo dados do Disque 100, plataforma do Governo Federal que recebe denúncias de violações dos direitos humanos. O número de denúncias no estado saltou de 19 para 76 em apenas um ano. No mesmo período, o aumento no Brasil foi de 103,82%, passando de 3.191 casos em 2023 para 6.504 em 2024. Esses números evidenciam que o racismo no Maranhão não é um problema isolado, mas estrutural, e reforçam a importância de decisões judiciais que reconhecem a gravidade dessas ofensas e garantem justiça às vítimas.
O Centro de Cultura Negra do Maranhão (CCN) esteve presente e atuante neste processo. Essa participação reafirma a importância da militância negra organizada na promoção da justiça e na proteção da dignidade do povo negro. O recado é direto: “O racismo é crime. Essa vitória judicial é também uma vitória política e cultural, pois reconhece o valor da identidade negra e a importância de espaços de resistência como o CCN. Para a sociedade, o chamado é claro: respeitem nossas histórias, nossos corpos e nossas vozes. Para o sistema de justiça, fica a responsabilidade de que essa decisão não seja exceção, mas parte de uma prática institucional comprometida com a equidade racial e a dignidade humana.”
Uma vitória, mas a luta é longa
A sentença é mais que uma resposta individual: é a confirmação de que o sistema de justiça deve estar a serviço da igualdade e do respeito. Mas também é um lembrete de que a luta contra o racismo é diária, estrutural e persistente. Casos como o de Poliana se repetem em diferentes espaços — no trabalho, na escola, na rua. Cada condenação é uma vitória, mas também um chamado para que a sociedade não se cale. Seguiremos firmes, ancestrais na memória e presentes na resistência, para que nenhuma ofensa contra a nossa identidade negra fique impune.